MANUAL
DO AUXILIAR PSIQUIÁTRICO
Transtornos
do Humor Psicóticos
Descrição
Geral
Diferentes
tipos de sintomas se encaixam dentro deste quadro clínico,
e todos eles envolvem grandes perturbações
da afetividade. Geralmente, os pacientes apresentam
períodos ou episódios de doença,
intercalados por períodos de saúde mental.
Os episódios podem ser maníacos (excitação,
muita atividade, agitação e loquacidade)
ou depressivos (desânimo, pouca atividade, tristeza,
depressão, angústia), ou apresentar esses
estados alternadamente. Por isso, esses transtornos
são comumente designados por psicoses cíclicas.
Essa doença é duas vezes mais comum entre
as mulheres do que entre os homens, podendo ocorrer
em qualquer idade, ainda que menos freqüente na
juventude.
Causas
As
causas dessa perturbação são complexas
e, sob certos aspectos, obscuras. Em sua incidência
parece haver uma tendência hereditária.
Ocorre com maior freqüência em pessoas de
personalidade ciclotímica (tipo corporal pícnico,
humor variável entre o otimismo e o pessimismo).
Das doenças mentais, é aquela em que a
hereditariedade parece ter maior importância.
Sintomas
Como
os sintomas da fase maníaca e da depressiva diferem
consideravelmente, serão descritos em separado.
Alguns pacientes manifestam apenas sintomas maníacos
ou apenas depressivos, ao passo que outros apresentam
as duas fases alternadamente ou exibem qualquer delas
em diferentes ocasiões:
Sintomas
Maníacos Somáticos: |
Sintomas
Maníacos Mentais: |
Necessidade
de estar sempre fazendo alguma coisa, de movimentar-se
constantemente. |
Autoconfiança,
convencimento.
Caprichos, instabilidade. |
Excitação
motora. |
Egoísmo,
tendência a ser intrometido e dominador. |
Aumento
do apetite sexual, pouca inibição. |
Intolerância
a críticas. |
O
falar pode ser rimado ou chistoso; as palavras
associando-se às vezes mais pelo som do
que pelo sentido. |
Pensamento
acelerado, fuga de idéias (sintoma muito
característico da mania), idéias
grandiosas, atenção dispersa. |
Cantos,
assobios ou risos, contínuos. |
O
paciente talvez não identifique bem as
pessoas, mas geralmente está bem orientado. |
Tendência
a enfeitar-se ou a despir-se. |
Distúrbios
de memória: ilusão do “já
visto e nunca visto”, falsos reconhecimentos,
ilusões. |
O
doente poderá destruir o colchão,
arrancar o reboco das paredes, empregar excrementos
para fins “artísticos”. |
Às
vezes, combatividade e agressividade. |
Insônia
por vezes rebelde. |
Agitação
permanente. |
Sintomas
Depressivos Somáticos |
Sintomas
Depressivos Mentais |
Pouca
atividade. |
Tristeza.
O doente julga-se um fracassado. Idéias
de culpa, de auto-acusação, de ruína,
de desgraça. Pessimismo. |
Fraqueza,
emagrecimento, cansaço fácil.
Aparência de grande abatimento.
|
O
paciente se diz incapaz de fazer alguma coisa,
julga-se um inútil. |
Língua
saburrosa. |
Gosta
de ficar isolado e evita a companhia dos outros. |
Tendência
ao mutismo. |
São
comuns as interpretações pessimistas
(batidas no porão significariam que estão
fazendo o seu caixão). |
Pouco
ou nenhum apetite. |
Alucinação
em alguns casos. |
Insônia
devida à preocupação. |
O
paciente poderá possuir relativa compreensão,
mesmo no estado de estupor. |
Tratamento
e Cura
Os
surtos dessa moléstia têm tendência
a desaparecer, embora as recidivas sejam de se esperar.
O surto pode durar alguns dias ou até vários
anos. Pouco se sabe sobre os fatores que trazem a recuperação,
mas a convulsoterapia e as drogas psicotrópicas
têm sido utilizadas, com muito êxito, no
tratamento desses pacientes. O eletrochoque era o tratamento
de escolha nos casos de depressão e apresenta
também bons resultados nos casos de agitação,
que são hoje tratados de preferência pelos
psicotrópicos: amplictil, reserpina, haloperidol,
sonoterapia, etc.
O
agravamento de novos surtos pode ser evitado, fazendo-se
com que o paciente compreenda o seu caso, saiba reconhecer
os sinais de recidiva e esteja apto a procurar o médico
tão cedo eles se apresentem. Essa doença
não causa dano permanente à mente ou à
personalidade do paciente.
Como
Cuidar desses Pacientes
Os
cuidados variam muito, de acordo com a fase maníaca
depressiva. As sugestões seguintes são
valiosas para se cuidar de quaisquer pacientes excitados
ou deprimidos, seja qual for o seu diagnóstico.
O
maníaco será provavelmente o seu paciente
mais interessante. Evite a inclinação
de amimá-lo ou exibi-lo a outras pessoas. Trate-o
com serenidade, respeito e bom-humor, evitando que ele
domine a enfermaria. Entretanto, se você tentar
contrariá-lo ele poderá reagir com agressividade.
A atenção de tais pacientes é fácil
de ser desviada, sendo este recurso de grande utilidade.
O silêncio é a melhor maneira de responder
às suas afrontas a menos que você tenha
a paciência e a boa vontade de “abrandar-lhe
a ira com uma resposta amena”. Discussões,
ordens autoritárias e argumentos não devem
ser utilizados. Tenha sempre em mente que o autocontrole
desses pacientes é tão fraco que eles
agem quase sempre sem pensar nas conseqüências.
É
muito aconselhável a remoção de
coisas irritantes, inclusive a voz do auxiliar psiquiátrico,
quando necessário. Assim, é freqüentemente
prescrito o isolamento. Não devem ser empregadas
contenções mecânicas, pois estas
seriam indício de que o auxiliar psiquiátrico
não soube lidar devidamente com o paciente -
ou de que o hospital não oferece condições
propícias. Os hospitais modernos aboliram completamente
o emprego não só do isolamento em quarto
fechado, como também das medidas coercitivas,
devendo ser este o padrão visado por todos os
estabelecimentos psiquiátricos. Muitas vezes
um lápis e uma folha de papel é só
o de que um maníaco necessita para gastar sua
energia e satisfazer sua ânsia criadora. Esses
pacientes freqüentemente tentam fugir, sentindo-se
detidos injustamente.
É
preciso atenção para os eventuais ferimentos
que eles venham a sofrer, porque com isso não
se preocupam. Como a recuperação geralmente
ocorre ao reconhecer o paciente a natureza os seus problemas,
nessa ocasião você muito o ajudará
procurando convencê-lo de se esforçar num
sentido construtivo.
Os
pacientes deprimidos são facilmente negligenciados
porque não fazem exigências. O auxiliar
psiquiátrico sensato, alegre e inteligente muito
poderá ajudar o tratamento desses pacientes.
Procure falar com o doente, ainda que ele não
responda, e tente auxiliá-lo a superar seu sentimento
de incapacidade e culpa, dispensando-lhe atenções.
A indecisão e a lentidão são freqüentes
nessa doença; assim, não force esses pacientes
a tomarem decisões, nem os apresse desnecessariamente.
Torne-lhes a vida a mais simples possível e ao
mesmo tempo, estimule a sua atividade e sociabilidade.
Por
vezes o deprimido torna-se extremamente queixoso e agarra-se
ao auxiliar psiquiátrico, exteriorizando lamentações
e lamúrias. Seja então paciente e atencioso,
evitando, todavia, discussões, explicações
ou aceitação das queixas do deprimido.
Procure encorajá-lo e infundir-lhe confiança.
O
deprimido freqüentemente recusa alimentação,
alegando "não merecê-la", “não
ter dinheiro para pagar por ela”, etc., de maneira
que, usando de tacto, você deverá persuadi-lo
a se alimentar. O suicídio é uma possibilidade
constante, sendo mais provável que as tentativas
ocorram no início e no fim das depressões
profundas. Nesse sentido é preciso muita atenção,
porque o paciente poderá fazer de tudo para captar-lhe
a confiança, antes de tentar o suicídio.
Melancolia Involutiva
Esta
forma de doença mental ocorre logo após
a idade madura e, mais freqüentemente, durante
a "idade crítica" ou climatério,
sendo muito mais comum entre as mulheres do que entre
os homens. O quadro é caracterizado por uma depressão
ansiosa, de longo curso, e que se desenvolve vagarosamente.
O paciente torna-se ansioso, preocupado e triste; torce
as mãos, anda de um lado para outro, esfrega
e belisca o rosto, geme às vezes, repetindo constantemente
alguma frase de desalento. Esses pacientes queixam-se
muitas vezes de doenças físicas imaginárias
(hipocondria) e, constantemente, solicitam tratamento
aos médicos e auxiliares. Algumas vezes têm
idéias de perseguição. A convulsoterapia
pelo eletrochoque é recomendada nesses casos,
mas o tratamento pelas drogas psicotrópicas (psicoanalépticos)
sempre deve ser utilizado. Nos casos mais rebeldes,
essas medidas terapêuticas podem ser associadas.
Como
Cuidar desses Pacientes
Eles
devem ser cuidados e tratados da mesma forma que os
deprimidos. A tendência ao suicídio é
mais freqüente neste tipo de doença do que
em qualquer outro, e você precisa dispensar especial
atenção a essa possibilidade. Tenha em
mente que o paciente, com firme idéia de suicídio,
planeja nesse sentido durante todo o tempo em que está
acordado; esteja, portanto, alerta para impedir qualquer
tentativa, vigiando-o constante e cuidadosamente, mantendo-o
afastado de lugares perigosos e não deixando
ao seu alcance objetos cortantes, pesados, quebráveis
ou que possam oferecer algum perigo. Ao mesmo tempo,
procure desviar a atenção do paciente
para outras coisas. Tente incutir nele a convicção
de ser necessário e útil, evitando, assim,
que ele deseje matar-se.
Parafrenia, Síndromes
Paranóides, Paranóia
Apesar
de serem essas moléstias incluídas atualmente
no grupo das esquizofrenias, muitos psiquiatras ainda
as consideram como entidades isoladas. A paranóia
é extremamente rara nos hospitais psiquiátricos,
mas os quadros parafrênicos e paranóides
são relativamente comuns.
Esses
pacientes freqüentemente se julgam personagens
superiores, de qualidades excepcionais, e acreditam
que estão sendo perseguidos e visados por maldade,
inveja, motivos políticos, etc. Inimigos estão
constantemente urdindo planos contra eles, espiões
os estão perseguindo, os jornais a eles se referem,
seus pensamentos estão sendo roubados, captados,
influenciados; seus alimentos estão sendo envenenados,
gases nocivos são inalados nos seus dormitórios,
seus inimigos procuram prejudicá-los sob todas
as formas, agindo com grande habilidade. Todos esses
delírios se afiguram ao paciente lógicos
e sensatos, e geralmente ele é capaz de narrá-los
com muita clareza. Os pacientes desse tipo muitas vezes
têm saúde física bastante boa e,
com exceção das idéias de perseguição,
não aparentam quaisquer outros distúrbios
psíquicos ou de personalidade. A deterioração
da personalidade (demência) pode ocorrer muito
tardiamente. Eles conservam, em geral, inteligência
muito atilada e, a menos que você consiga granjear-lhes
a confiança, seus argumentos encontrarão
enorme resistência. Ouça-os narrarem os
seus delírios sem aceitá-los, nem ridicularizá-los;
talvez você possa oferecer-lhes outras interpretações
dos fatos que os preocupam, mas convém evitar
tudo o que possa incentivar os seus delírios.
A leitura escolhida é uma boa atividade recreativa
que você poderá proporcionar-lhes. Os doentes
parafrênicos são em geral hostis ao hospital
e aos seus regulamentos e, por isso, poderão
tentar fugir, ou mesmo se tornar agressivos sob ação
dos seus delírios. Lembre-se de que esses pacientes
são hábeis dissimuladores. Como eles parecem
estar senhores de si durante quase todo o tempo, você
se sentirá inclinado a considerar seus atos mórbidos
como simples manifestações de obstinação
e maldade; afaste essa idéia e lembre-se sempre
de que eles estão gravemente doentes. Embora
essas formas clínicas sejam rebeldes, com o advento
da "era dos psicotrópicos", o seu prognóstico
tornou-se bem mais favorável e freqüentemente
se consegue obter boas remissões desses quadros.
As recidivas podem surgir e surgem muita vezes, mas,
com a repetição do tratamento, também
são possíveis novas remissões.
Psiconeuroses e Neuroses
Descrição
Geral
Sob
esta denominação se reúne uma grande
variedade de distúrbios. Estes atingem apenas
uma parte da personalidade e não parecem afastar
o paciente da realidade, nem afetar a consciência.
Nestas desordens, certas tendências, comuns a
todos nós, passam a dominar os atos e pensamentos
do indivíduo, sem qualquer proporção
com a importância relativa de tais tendências.
As neuroses são muito comuns entre a população
em geral, pois, durante a II Grande Guerra, cerca de
40 a 50% dos soldados dispensados das fileiras militares
sofriam de distúrbios desse tipo. Apesar dessas
manifestações serem muito generalizadas,
apenas uma pequena percentagem de psiconeuróticos
é internada nos hospitais psiquiátricos.
Eles são, em geral, tratados em ambulatórios.
Causas
A
história pregressa do paciente geralmente revela
mau ajustamento aos problemas da vida desde a infância,
defeitos educacionais, conflitos no ambiente familiar.
Há motivos para crer que a causa básica
dessas perturbações resida num modo falho
de encarar os desapontamentos e frustrações.
A causa aparente é habitualmente algum acontecimento
ou preocupação especial, como seja: preocupação
econômica, conflitos religiosos, problemas sexuais,
acidentes, doenças e coisas semelhantes.
Sintomas
Em
geral, esses pacientes estão constantemente preocupados
e ansiosos, habitualmente conservam sua integridade
psíquica e não sofrem delírios,
mas são muito sugestionáveis; com freqüência
sentem-se compelidos a repetir alguma ação
rotineira, constantemente, embora reconheçam
a tolice do seu procedimento; ou talvez se vejam obcecados
por um pensamento que não conseguem afastar;
ou então sentem-se continuamente oprimidos por
um receio estranho e injustificado.
Não
apresentam sintomas físicos específicos,
embora estejam com freqüência debilitados
devido à sua preocupação e ansiedade.
Mencionaremos a seguir algumas das psiconeuroses e neuroses.
Estado
de Ansiedade, Neurose de Angústia -
Preocupação contínua e extrema
com algum problema, às vezes de pequena monta.
Angústia e ansiedade manifestas.
Histeria,
Pitiatismo - O paciente aparenta os mais variados
sintomas físicos, como paralisias, dores, impossibilidade
de ação, perda da visão ou audição,
ataques semelhantes aos epilépticos, atitudes
teatrais, dramáticas, etc., sem que existam anomalias
orgânicas correspondentes aos sintomas. Não
se esqueça de que, nestes casos, o paciente sempre
deseja uma platéia. Ele gosta de ser um "ator"
diante dos seus "espectadores".
Neurastenia
- Fadiga ou exaustão nervosa, tanto
do corpo como do espírito. Sintomas hipocondríacos.
Queixas diversas a respeito dos diferentes órgãos.
Psicastenia
- Incapacidade de deixar de fazer ou pensar
coisas desarrazoadas e desnecessárias. Sintomas
mais de ordem psíquica. Ansiedade. Cansaço
psíquico permanente. Dificuldade na execução
do menor esforço intelectual.
Neurose
Obsessivo-Compulsiva - Neste caso o doente
se vê dominado por idéias fixas, tolas,
que não consegue afastar do seu espírito
por mais que se esforce, ou então se sente compelido
a realizar atos pueris, inúmeras vezes (abrir
e fechar portas, contar os degraus da escada, o número
de passos que dá em determinada direção,
etc.). É dominado por um “ritual”,
do qual não se consegue libertar e se torna extremamente
angustiado quando impossibilitado de executá-lo.
Tratamento
e Cura
As pessoas
com estas perturbações podem geralmente
ajustar-se à vida, pois não sofreram dano,
seja em sua personalidade, seja em seu psiquismo. Os
casos mais graves, ou os que se encontram em fase aguda,
são os que você irá encontrar nos
hospitais psiquiátricos. É necessário
tratar qualquer mal físico de que acaso sofra
o paciente, mas o tratamento mais importante é
o psicológico, com o objetivo de conseguir que
o paciente veja claramente a natureza de suas dificuldades
e encontre melhores meios de se adaptar à vida.
Em geral, o estado mórbido se explica como uma
fuga a certas situações, que o paciente
teria de enfrentar se estivesse no seu estado normal.
Ele necessita da oportunidade de encontrar incentivo
em uma ocupação pela qual sinta inclinação,
e de sentir-se bem em situações normais.
A psicoterapia e a terapêutica recreativa e educacional
devem sempre ser empregadas em seu tratamento. Qualquer
paciente reeducável poderá ser reintegrado
na vida normal. Atualmente, no tratamento desses pacientes,
são muito utilizados o psicodrama e a "psicoterapia
de grupo".
Como
Cuidar desses Pacientes
Sendo
perfeitamente normais sob muitos aspectos, não
são eles difíceis de tratar; você
precisa ter o cuidado de não atribuir à
simples teimosia ou má vontade a sua incapacidade
sob alguns aspectos. Estão realmente tão
doentes quanto os cardíacos, por exemplo. Coopere
para proporcionar ao paciente uma vida sã, com
boa alimentação, exercício, ar
fresco e descanso; faça tudo o que puder para
que ele se distraia e aprecie a companhia dos demais.
Evite excesso de cuidados e tratamentos desnecessários
para não alimentar nele o desejo de atrair a
atenção, e não consinta que ele
fique só, concentrado em si mesmo. Empregue constantemente
a sugestão positiva e trabalhe em uníssono
com o médico, cooperando com o seu tratamento
em todas as oportunidades. Como esses doentes procuram
quase sempre reagir contra a influência do médico
e granjear o apoio do auxiliar psiquiátrico para
as suas idéias errôneas, você precisa
ter cuidado no que lhes diz. Aprenda a ser um bom ouvinte,
mas fale apenas quando tiver certeza de que o que está
dizendo não prejudicará o trabalho do
médico. Os neuróticos em sua maioria não
necessitam de internação e são
tratados em ambulatório.
Outros Tipos de Distúrbios
Os
demais pacientes dos hospitais psiquiátricos
são classificados sob vários diagnósticos
e designações. Pequena percentagem das
novas internações correspondem a perturbações
mentais provocadas por alguma doença física
ou a distúrbios ligados a personalidades psicopáticas.
Este último grupo é integrado por pessoas
com distúrbios de conduta, que, por vezes, necessitam
de tratamento hospitalar. As personalidades psicopáticas
constituem grave problema para o hospital, dadas as
suas perversões, irregularidades, falta de senso
ético-moral, tendência à mentira
e a múltiplas desordens de conduta. São
pacientes indisciplinados, agressivos e insaciáveis.
Em geral, não apresentam distúrbios da
consciência e da inteligência; é
preciso muito tato, bom-senso e paciência no trato
com eles. Como esses pacientes necessitam de tratamento
muito individual, não poderemos sugerir cuidados
especiais.
Sumário
As
observações anteriores sobre as doenças
mentais não abrangem tudo, nem são completas;
têm apenas a finalidade de servir de indicação
geral para lhe facilitar a compreensão dos pacientes
que estão sob os seus cuidados. Poucos pacientes
se enquadrarão exatamente em qualquer uma dessas
descrições ou em qualquer outra descrição
de um tratado de doenças nervosas. Você
precisará, portanto, encarar cada paciente como
um caso individual. A orientação sugerida
no primeiro capítulo deste manual é a
orientação básica que você
deverá seguir; as informações deste
capítulo tem por objetivo ampliar o seu conhecimento
e compreensão dos vários tipos de pacientes,
a fim de que você possa compreendê-los como
indivíduos.
Se
você estiver interessado em estudar melhor o doente
mental e os meios de auxiliá-lo, encontrará
bons esclarecimentos nas leituras a seguir sugeridas.
Livros Sugeridos
"Um
Espírito que se achou a Si Mesmo" - Clifford
Beers
"Quatro Gigantes da Alma" - Emílio
Mira y Lopez
"Médicos do Espírito. Romance da
Psiquiatria" - Marie Beynon Rey
"La Voluntad de Vivir" - Wilhelm Stekel
"Cartas a una Madre" - Wilhelm Stekel
"Higiene da Alma" - Barão de Feuchtersleben
3.
Histórico
Tempos
Idos
A
doença mental é tão antiga quanto
a raça humana, mas só recentemente atraiu
a atenção dos meios científicos.
Os maiores progressos psiquiátricos ocorreram
durante os últimos cinqüenta anos. Ainda
assim, o que hoje sabemos é apenas uma parcela
do muito que esperamos saber algum dia.
Há
dois séculos atrás, as pessoas que sofriam
de doença mental eram geralmente consideradas
como possuídas por espíritos malignos
ou pelo demônio. Conforme o caso, eram reverenciadas
como divindades ou flageladas, punidas e até
queimadas vivas, como bruxas ou demônios. A segregação
dos doentes mentais em hospícios começou
no mundo cristão em 1537, quando o hospício
de Bethlehem, depois conhecido por Bedlam, foi inaugurado
em Londres. Os maus tratos e a negligência que
reinavam nos primeiros hospícios permanecerão
sempre como uma nódoa na história da humanidade.
Pioneiros
Em
1792, Phillipe Pinel, na França, e em 1796 William
Tuke, na Inglaterra, foram os pioneiros no tratamento
humanitário dos doentes mentais. Sob a direção
desses dois homens, foram pela primeira vez rompidas
as algemas que prendiam os chamados loucos.
Em
1841, Dorothea L. Dix, uma professora de Massachussetts,
nos EE. UU., iniciou uma campanha obstinada para conseguir
que os doentes mentais fossem melhor alojados, cuidados
e tratados. Sob o seu estímulo, muitos hospitais
psiquiátricos foram instalados nos EE. UU. e,
até mesmo, na Europa. No Brasil, os nomes de
Franco da Rocha e Juliano Moreira se inscrevem entre
os pioneiros da reforma da assistência aos psicopatas.
Em
1907, Clifford Beers, com seu livro "Um Espírito
que se achou a Si Mesmo", impulsionou o movimento
em prol da higiene mental, que fora iniciado na França
por Toulouse. Seguiram-se, então, nos últimos
cinqüenta anos, grandes reformas no tratamento
hospitalar aos doentes mentais, em todo o mundo. A Federação
Mundial para a Saúde Mental muito concorreu para
isso.
Nasce
uma Ciência
Enquanto
progrediam os cuidados hospitalares dispensados aos
doentes mentais, havia homens que procuravam elevar
o nível da psiquiatria ao de uma ciência
curativa. Entre esses cientistas que primeiro descobriram
e exploraram os íntimos recessos do espírito
humano figuram alguns dos grandes heróis da humanidade.
A sua história é tão empolgante
quanto a de qualquer outro grupo de grandes pioneiros.
Um
dos primeiros problemas a serem atacados tinha de ser
o estudo do cérebro humano. Durante as guerras
napoleônicas, Sir Charles Bell, cirurgião
do exército, teve a oportunidade de ver cérebros
em todas as condições, nas barracas de
guerra. Em 30 anos ele observou mais sobre a fisiologia
cerebral do que a medicina nos 1.600 anos anteriores.
O seu mapa cerebral abriu caminho para os estudos mais
aprofundados de Paul Broca, em 1860.
Brilhante,
versátil, eloqüente, trabalhador prodigioso
- é Broca figura proeminente na história
de medicina. Suas pesquisas exaustivas sobre o funcionamento
do cérebro humano levaram-no a descobrir que
certas funções, como a da palavra, estão
localizadas em determinadas zonas do cérebro.
Isto abriu caminho para a cirurgia do sistema nervoso.
As relações entre o cérebro e o
espírito foram mais bem esclarecidas por seu
trabalho, que lançou as bases para o tratamento
fisiológico das doenças mentais.
Surgiram
dois homens que se tornaram pais de dois ramos muito
unidos da medicina. Um deles, Brown-Sequard, tinha uma
curiosidade insaciável, que o levava a realizar
experiências em si próprio. A sua maior
realização foi a descoberta da importância
das secreções glandulares sobre as funções
físicas e mentais do homem - tornou-se ele, assim,
o pai da endocrinologia. A distinção de
se tornar pai da neurologia coube a Hughlings Jackson,
um inglês, cujas realizações o colocam
entre os maiores heróis da ciência. Durante
cinqüenta anos, no fim do século passado,
ele explorou o cérebro e o sistema nervoso.
O
Espírito do Homem
Se
os aspectos fisiológicos da psiquiatria começaram
a ser estudados nos campos de batalha de Napoleão,
os psicológicos foram primeiro encarados numa
atmosfera de superstição e magia remanescente
dos tempos obscuros da história. Por volta de
1750, Anton Mesmer, o "homem da casaca lilás",
começou com ímãs, como agentes
curativos, e evoluiu para a teoria do magnetismo animal,
hoje considerada fantástica. O mesmerismo logo
caiu em descrédito entre a classe médica.
Um século depois, porém, um escocês
teimoso, James Braid, transformou o hipnotismo numa
terapêutica de bases científicas. Nas últimas
décadas de 1800, Liebeault e Bernheim salientaram
que o hipnotismo é essencialmente sugestão,
e Janet iniciou investigações acerca da
parte subconsciente do espírito.
Por
volta da passagem do século, em Viena, Sigmund
Freud começou a expor suas teorias sobre o inconsciente
ou subconsciente e como explorá-lo. Há
grandes controvérsias sobre o mérito das
teorias de Freud e dos seus resultados no tratamento
das doenças nervosas e mentais. Suas técnicas
de exploração do subconsciente e o seu
conceito dinâmico do psiquismo servem de base
ao tratamento das psiconeuroses e deram grande prestígio
à reeducação, como meio de restabelecer
a saúde mental. Com a ajuda dos discípulos
dissidentes de Freud, Alfred Adler, C. G. Jung e muitos
outros, a escola psicanalítica difundiu-se por
todo o mundo. É indiscutível o mérito
das teorias psicodinâmicas, ainda que encaradas
hoje com muitas restrições.
Por
fim, a Psiquiatria
Entretanto,
mesmo com os progressos nos campos fisiológico
e psicológico, ninguém se dedicara ainda
a estabelecer a psiquiatria como uma ciência médica.
Por
volta de 1900, Emil Kraepelin empreendeu essa tarefa
monumental, fazendo uma classificação
cuidadosa das doenças mentais. A custa de inúmeras
observações e registros clínicos,
ele sistematizou as doenças mentais para que
a psiquiatria emergisse como uma ciência autônoma.
Desde então, viu-se ela livre de muitos dos liames
que a tolhiam e pôde dedicar-se inteiramente à
tarefa de curar as doenças mentais e ocupar-se
de sua profilaxia. Kretschmer, Bleuler, Bumke, entre
muitos outros, continuaram a obra iniciada por Kraepelin.
Em
princípios deste século, um médico,
Wagner-Jauregg, começou a idealizar a cura de
certas doenças mentais por meio da febre. Anos
mais tarde, fez experiências com uma espécie
de febre e, depois, com outra, sem que nenhuma delas
o satisfizesse. Dedicou-se mais à Paralisia Geral,
porque essa doença era mais conhecida, Em 1917,
com 60 anos, Wagner-Jauregg experimentou o emprego da
malária e desenvolveu um tratamento para a Paralisia
Geral, com o qual se obtém êxito em dois
terços dos casos antigamente considerados incuráveis.
Esse tratamento foi depois suplantado pela penicilinoterapia.
Em
1927, um jovem psiquiatra de Viena deu um passo ousado.
Administrou doses elevadas de insulina a uma toxicômana
para acalmá-la. Aconteceu o que desejava: a paciente
acalmou-se. Experimentou, então, a droga em outros
pacientes agitados, entre eles, esquizofrênicos.
Observou, então, o inesperado: uma alteração
favorável na personalidade desses pacientes.
O Dr. Manfred Sakel começou, pois, a tratar as
psicoses, inclusive a esquizofrenia, pelo choque insulínico,
até hoje bastante empregado no tratamento das
esquizofrenias.
Na
época em que Sakel anunciou o seu tratamento
pela insulina, em 1933, um médico húngaro,
von Meduna, estava trabalhando com a terapêutica
pelo choque. Experimentou provocar convulsões
com o cardiazol. Esse tipo de tratamento revelou-se
excepcionalmente eficiente nas psicoses maníaco-depressivas
e em algumas formas de esquizofrenia.
Em
1937, em Roma, Cerletti e Bini, começaram a procurar
algo que não produzisse as sensações
terrificantes do cardiazol. Empregaram a eletricidade,
experimentando-a primeiro em porcos e ousando depois
aplicá-la em seres humanos.
Por
sua relativa segurança e eficácia, o eletrochoque
tornou-se uma das terapêuticas mais utilizadas
em todo o mundo, sendo ainda hoje muito empregado, sobretudo
no tratamento dos estados depressivos.
Atualmente
Com
todos esses progressos chegamos ao tempo atual. Pioneiros
ainda continuam a pesquisar tratamentos para as doenças
mentais.
A
pesquisa de tratamentos continua, não apenas
com a convulsoterapia e suas variantes. Bioquímicos
e endocrinologistas trabalham com várias fases
da doença mental. Extratos glandulares são
administrados para corrigir deficiências e perturbações
mentais devidas a desequilíbrios glandulares
e grande número de drogas psicotrópicas
são hoje utilizadas como tratamento. Os cirurgiões
pesquisam novas operações cerebrais para
corrigir os casos mais renitentes e a psicocirurgia
da epilepsia já é uma realidade. Numerosas
drogas psicotrópicas vêm sendo sintetizadas
pelos vários laboratórios em todas as
partes do mundo, cada uma delas para o tratamento específico
das várias desordens do psiquismo, permitindo,
como nunca antes, o tratamento eficiente de um número
cada vez maior de doentes mentais. Os resultados que
vêm sendo obtidos são tão importantes
e valiosos, que vêm impondo novos conceitos sobre
as doenças mentais e sobre a construção
dos hospitais psiquiátricos.
O
tratamento das doenças neurossifilíticas,
sobretudo o da Paralisia Geral, sofreu grandes alterações
com a introdução da penicilinoterapia,
que é hoje a sua terapêutica de escolha.
Os
progressos na eletrencefalografia também trouxeram
novos conhecimentos, principalmente no campo das epilepsias.
No
tratamento das doenças mentais, a tendência
atual da psiquiatria é o emprego dos diferentes
métodos, de acordo com as características
de cada caso. Existem ainda os chamados métodos
auxiliares - terapêutica pelo trabalho e pela
recreação, que estão sendo largamente
utilizados.
O
Futuro
A
pesquisa psiquiátrica está agora em uma
de suas etapas mais decisivas. Em nossos dias, calcula-se
que, de cada 1.000 pessoas, cinco, anualmente, necessitarão
ser hospitalizadas para tratamento de doença
mental. A segunda guerra mundial, como a primeira, contribuiu
para o aumento das perturbações mentais.
Entretanto,
as perspectivas de progresso no seu tratamento são
boas. Parece não haver dúvida de que esta
época será mais tarde considerada como
a "idade de ouro" da psiquiatria.
A
melhoria dos hospitais psiquiátricos e dos cuidados
neles dispensados continua a ser uma das medidas mais
necessárias para o progresso da psiquiatria e
da higiene mental. Como auxiliar psiquiátrico
você talvez não será particularmente
lembrado, mas, anonimamente, terá contribuído
para esse serviço. Cada dia em que você
fizer bem o seu trabalho e de acordo com a orientação
deste MANUAL você estará contribuindo para
o êxito desse movimento. Além de fazer
bem o seu trabalho diário, você pode contribuir
para a melhoria do seu hospital, solicitando para que
seja proporcionado aos auxiliares psiquiátricos
cursos de treinamento, leituras instrutivas e facilidades
recreativas; interessando-se para que sejam melhoradas
as condições de trabalho - salário,
acomodações, horário, planos de
promoção e de aposentadoria; reconhecendo
a importância de todos que trabalham no hospital
e a todos prestando a sua cooperação.
Muitos desses objetivos, segundo você verificará,
só poderão ser atingidos por atos legislativos
ou das autoridades administrativas; mas tais atos necessitam
ser estimulados e apoiados por uma opinião pública
expressiva e esclarecida. Portanto, cada vez que você
comunicar a alguém o seu ponto-de-vista esclarecido
sobre a doença mental e conseguir a sua cooperação
para um melhor tratamento, estará contribuindo
para o progresso da saúde mental.
O
progresso no tratamento das doenças mentais poderá
prosseguir sem o seu interesse e apoio. Mas você
poderá tomar parte nesse trabalho vital, se quiser.
Certamente, tudo o que você fizer para difundir
um pouco mais o programa da psiquiatria contribuirá
também para torná-lo um melhor auxiliar
psiquiátrico. Você tem um trabalho de significação
e importância. Tire dele o melhor partido possível!
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