INTERNAÇÕES
INVOLUNTÁRIA E COMPULSÓRIA EM PSIQUIATRIA:
ÚLTIMAS NORMATIZAÇÕES
Mauro Aranha de Lima
Câmara Técnica de Saúde
Mental do Cremesp
A prática
da clínica psiquiátrica pode trazer situações
de conflito de interesses entre médico e paciente,
como a que se refere a eventual indicação
de internação por aquele e recusa deste
último em submeter-se à mesma.
As
situações mais nítidas onde isso
acontece são:
1. Paciente com rebaixamento ou estreitamento da consciência
(como no estupor catatônico esquizofrênico
ou depressivo, no transtorno dissociativo histérico
e outros).
2. Paciente com preservação da consciência,
mas sem capacidade ou competência para uma decisão
racional (como nos diversos transtornos delirantes ou
alucinatórios e outros).
A
decisão do médico especialista em indicar
a internação emerge, segundo Taborda (1),
em algumas circunstâncias e se apóia nos
princípios da Beneficência, Não
Maleficência e Justiça — só
desconsiderando, aqui, a Autonomia do paciente, na medida
em que esta, se exercida, poder-lhe-ia ser autolesiva,
no que tange à sua integridade física,
psíquica e moral.
As mencionadas circunstâncias são:
- Presença de doença mental (exceto transtorno
de personalidade anti-social), além de, no mínimo,
uma das seguintes condições:
- Risco de auto-agressão
- Risco de heteroagressão
- Risco de agressão à ordem pública
- Risco de exposição social
- Incapacidade grave de autocuidados
Neste
contexto, o Estado, sob lei no. 10.216/2001, confere
ao médico especialista, com o beneplácito
da família ou responsável legal do paciente,
a possibilidade da internação involuntária.
Na
ausência da família — ou em sua não
concordância — o Estado pode, usando ainda
como base a lei nº.10.216/2001, art.3 e, segundo
Diniz (2), a teoria do parens patriae, autorizar sua
internação compulsória, através
de juiz competente.
O Ministério
da Saúde, sob a portaria no. 2391/GM/2002 prevê,
então, no art.3o. quatro modalidades de internação:
1. Internação psiquiátrica voluntária
(IPV).
2. Internação psiquiátrica involuntária
(IPI).
3. Internação psiquiátrica voluntária,
que se torna involuntária no decorrer da mesma
(IPVI).
4. Internação psiquiátrica compulsória
(IPC).
Na
IPV, estabelece que o paciente deve assinar, no momento
da admissão, termo de consentimento livre e esclarecido,
concordando com a necessidade da mesma.
Estabelece
também que a IPI e a IPVI devem ser objeto de
notificação ao Ministério Público
Estadual, do local onde o evento ocorrer, até
72 horas após, respectivamente, o momento da
internação, ou o da não concordância
do paciente em sua continuidade. Também, no prazo
de 72 horas após a alta, em qualquer uma das
duas situações anteriores, dever-se-á
notificá-la ao referido órgão.
Segundo
o art.10º da portaria nº 2391/GM/2002, cabe
ao Ministério Público Estadual instaurar
uma Comissão Revisora das Internações
Psiquiátricas Involuntárias (IPI e IPVI),
que iniciará o acompanhamento desses casos no
prazo de 72 horas após o recebimento da comunicação
pertinente — devendo emitir laudo de confirmação
ou suspensão do regime de internação,
no período de sete dias.
Essa
Comissão Revisora deve ser multiprofissional,
contendo, no mínimo:
1. Um psiquiatra ou clínico-geral com habilitação
em Psiquiatria, não pertencente
ao corpo clínico do estabelecimento onde ocorrer
a internação.
2. Um profissional de nível superior da área
de Saúde Mental, com a mesma condição
anterior.
3. Um representante do Ministério Público
Estadual.
É
importante notar que, embora não de forma obrigatória,
a portaria recomenda fortemente a presença nessa
Comissão de representantes de associações
de direitos humanos, ou de usuários de serviços
de saúde mental e familiares, inspirando-se nos
"Princípios para a proteção
de pessoas acometidas de transtorno mental e para a
melhoria da assistência à saúde
mental", da Assembléia Geral das Nações
Unidas/1991, na Resolução CFM nº
1407/1994 e, ainda na reforma psiquiátrica, em
andamento no país.
Dentro,
ainda, dessa inspiração humanista, a lei
nº 10.216/2001, no art. 2º, contempla os direitos
da pessoa portadora de transtorno mental, os quais citamos,
entre outros: garantia de sigilo, livre acesso aos meios
de comunicação disponíveis e recepção
do maior número possível de informações
sobre o próprio estado de tratamento.
Além
disso, no seu art.4º expressa que o tratamento
— em regime de internação ou não
— deve ter como finalidade permanente a reinserção
social do paciente em seu meio.
Para
que tal ocorra, a portaria nº 147/SAS/1994 —
http://www.bioetica.org.br/noticias/leg_images/port_147.html
desde então prevê, nas normas para tratamento
hospitalar/hospital especializado em Psiquiatria:
1. atendimento individual (medicamentoso, psicoterapia
breve, terapia ocupacional, dentre outros).
2. atendimento grupal (grupo operativo, psicoterapia
em grupo, atividades socioterápicas).
3. abordagem à família, incluindo orientação
sobre o diagnóstico, o programa de tratamento,
a alta hospitalar e continuidade do tratamento.
4. preparação do paciente para a alta
hospitalar, garantindo sua referência para a continuidade
do tratamento em programa interdisciplinar de atenção
compatível com sua necessidade (ambulatório,
hospital-dia, núcleo/centro de atenção
psicossocial), visando prevenir a ocorrência de
outras internações.
Bibliografia:
1. Taborda, JGV. Psiquiatria Legal. In: Taborda, JGV,
Prado-Lima P, Busnello ED. Rotinas em Psiquiatria. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1996:280-296.
2. Diniz, MH. O estado atual do Biodireito. São
Paulo: Editora Saraiva, 2ª Edição,
2002:169-172.
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